É a cor do céu nas primeiras horas da manhã

domingo, 30 de janeiro de 2011

O SAPO ESTÁ FELIZ

— Sapabela! Alô!
— Oi, Rospo... Que alegria!
— Liguei para dizer que estou feliz, Sapa.
— Ligou só para isso? Só para dizer que está feliz?
— É...
— Pois então, feliz estou eu agora. Um amigo que tanto prezo feliz está, então lá vou eu também para o "Feliz"... Mas...
— "Lá vem o 'Mas' da Sapa" — Mas o quê Sapabela?
— Fale baixo, Rospo.
— Devo falar baixo? Eu não sei fazer isso quando feliz estou...
— Se você continuar anunciando a sua felicidade vai incomodar muitos sapos...
— É mesmo, Sapabela?
— Sim, muitos "amigos" não suportarão saber que você está feliz...
— Mas isso é um problema deles, Sapa...
— Sentirão incômodo, inveja, ciúmes... É difícil, para muitos, suportar a felicidade alheia. A felicidade do outro incomoda. Essa coisa tão terrível que é a felicidade do outro...
— Mas isso é um problema deles, Sapa...
— Tão incomodados ficarão que até a paz de espírito poderão perder... Passarão a ocupar as próprias mentes com a sua felicidade. Em vez de também serem felizes, perderão o precioso tempo da vida e gastarão suas energias mentais tentando aceitar o fato de que você simplesmente está feliz...
— Mas isso é um problema deles, Sapa...
— Tem razão, Rospo. Fale alto, leve aos céus a sua voz, diga com o tórax repleto de energia que você está feliz... Cultive a sua felicidade para que ela goste de você e se aloje em seu coração feito pássaro se aninhando...
— Vamos nos encontrar para um sorvete? Hoje é domingo...
— Vamos, Rospo, só irei pôr uma saia rosa que reservei para o domingo e a flor amarela nos cabelos... Quer dizer, na cabeça...
— Sapabela, agora sim a minha felicidade cresceu demais...
HISTÓRIAS DO ROSPO — 31
Marciano Vasques

As histórias do Rospo estão em 
CASA AZUL DA LITERATURA INFANTIL
http://casaazuldaliteraturainfantil.blogspot.com/

SAPO, FILÓSOFO, POETA...

— Rospo, por que tantos sapos se ocupam com o tema "Morte"?
— Não sei. Talvez para produzirem histórias de terror, de assombrações, essas narrativas que divertem e arrepiam...
— E você? Vive se ocupando com a morte?
— Não! Só com a vida.
— Sei. É um  filósofo...
— Não me considero, mas talvez esteja a imitar o filósofo autêntico: aquele que só pensa na vida.
— O poeta é irmão do filósofo...
— Por isso, Sapabela,  a poesia é para a vida, que a cada poema se renova.
— A cada conversa nossa, Rospo.

HISTÓRIAS DO ROSPO — 30
Marciano Vasques

SAPABELA PERGUNTA

Um sapo e sua amiga conversam à beira do lago.
— Rospo, já foi arrogante?
— Algumas vezes quis que os outros sapos apreciassem o meu conhecimento sobre algo.
— E isso não é bom?
— Nem todos querem saber de outros saberes...
— Entendo. Você quis dividir a felicidade...
— Para uns o conhecimento não é sinônimo de felicidade...
— Já foi preconceituoso?
— Já formei pré-conceito, já julguei, já me posicionei antes de conhecer a coisa.
— E hoje?
— Vou sempre em busca do conhecimento para só depois me posicionar
— Já se julgou superior por ter o conhecimento de algo?
— O verdadeiro conhecimento não torna alguém arrogante a ponto de subestimar os outros...Mas, quantas perguntas, Sapabela!
— Aquela flor me inspirou. Sabe o nome dela?
— Aquela? Narciso.

HISTÓRIAS DO ROSPO — 29
Marciano Vasques

PRECIOSA CONVERSA

Rospo está escrevendo um convite de lançamento de um novo livro, quando surge a sua amiga Sapabela.
— O que está fazendo, Rospo?
— Escrevendo em um convite.
— Posso ver?
— Sim.
— Rospo, você errou!
— Errei?
— Pôs:"Conto com  sua preciosa conversa", em vez de " preciosa presença".
Rospo ri feito um sapo.
— Ora, Sapabela, minha sapíssima, é mesmo "preciosa conversa", pois se o convidado não levar a conversa, a presença fica órfã.
HISTÓRIAS DO ROSPO — 28
Marciano Vasques

A VALORIZAÇÃO DO ARTISTA

Sapabela e Colibrã num passeio quando encontram um dentista:
— Você é a famosa Colibrã? Dê uma amostra do seu talento, fazendo uma coreografia,
— Só se o senhor extrair um dente agora.
— Não posso fazer isso.


Depois, encontram um piloto.
— É a minha bailarina preferida! Admiro muito o seu talento. Pode executar um passo de dança?
— Só se o senhor pilotar um avião agora...
— Não posso fazer isso.


As duas prosseguem o passeio.
— Não foi muito brusca com eles, Colibrã?
— Não, Sapabela. Precisam compreender que o artista não está sempre disponível para a satisfação geral.
— Lá vem o nosso poeta Rospo.
— Colibrã! Dê um giro. Quero vê-la bailando.
— Vai escrever um poema agora, Rospo?
HISTÓRIAS DO ROSPO — 27
Marciano Vasques

ROSPO E A ESPERTEZA

— Rospo, o que é para você um sapo esperto?
— É o sapo que aprecia HQ, adora ler livros, jornais, gibis, poemas...Também gosta de festas, teatro, cinema, e não perde uma boa música. E por uma boa conversa acende uma fogueira...
— Conversa?
— A conversa é irmã do cinema, da leitura, do livro...
— Então o sapo esperto aprecia as coisas boas da vida?
— E quando fica sabendo de uma injustiça imediatamente bota a boca no ar.
— Rospo, você mudou o conceito de esperteza! Para muitos, esperteza é trapacear, é vencer a qualquer custo, é enganar os outros, furar filas, querer ser o primeiro em tudo..
— Sapabela, você perguntou sobre o sapo esperto, não sobre o sapo idiota.
HISTÓRIAS DO ROSPO — 26

Marciano Vasques

ROSPO NO METRÔ

Inconformado com o fato de uma senhora sapa viajar ao lado de sua filha sem dizer uma palavra com a sapinha, Rospo bota a boca no ar.
— Minha senhora, chegamos. É a última estação.
— Eu sei, sapo! Eu vi.
— Mas não viu a sua própria indelicadeza, a sua própria estupidez, que geralmente é "Invisível" aos próprios olhos.
— Do que o senhor está falando? Por acaso me conhece?
— Conheci nesta viagem. Por que faz isso com o futuro?
— Você é maluco? Nem sei do que está falando...
— Não trocou uma palavra com a sua filha. Ficou ao lado dela em silêncio, como se ela fosse uma desconhecida...Por acaso não sabe que criança adora conversar? Quer que ela fique parecida com a senhora?
— Seu sapo atrevido! Se eu não conversei com a minha filha, o que o senhor tem a ver com isso?
— Tenho tudo a ver. A criança, o sapinho, é da sociedade, é de todos, é da comunidade dos sapos...Todos devemos cuidar dos pequenos. Não faça mais isso. Não desperdice a oportunidade de conversar com o futuro. Não crie uma geração acanhada, muda, insegura...
— Sapo, foi apenas uma viagem de metrô!
— Foi mais do que isso. Foi uma grande perda! A propósito, meu nome é Rospo.
— Tchau, seu Rospo, tchau...
— Tchau, Sapinha.
— Não fale com estranhos! Eu já lhe proibi!
— Mas, mãe...
— Silêncio!
HISTÓRIAS DO ROSPO — 25
Marciano Vasques

O FRIO CHEGOU

— Rospo, o frio chegou. Quero que fale dez coisas que tenham a ver com ele.
— Adora uma brincadeira, não é, Sapabela? Mas essa é fácil.
— Manda ver.
— Para os adultos, como eu, ora, vejamos...
— Vamos, Rospo...
— Vinho; música; poesia; livro; cinema; teatro; pão quente e bolo de cenoura; conversar; contar ou ouvir histórias de assombrações; ler jornal, começando pelas tiras de HQ...
— Rospo, tirando o vinho, tudo o que você falou o sapinho esperto também aprecia... Mas esqueceu de um...
— Qual?
— Namorar.
— Você não perde a mania de aperfeiçoar tudo, não é?
—- Quem é Sapabela, Sapabela é...
— Convencida...
— É brincadeira.
— Sei, adora uma brincadeira. Mas, falando em frio, que tal um sorvete?
— Sorvete?
— Desculpe, é a força do hábito, eu quis dizer...
— Um licor? Licor de cacau? de cereja?...
—"Eu havia pensado apenas em pipoca...!"
 
 
 
HISTÓRIAS DO ROSPO — 24
Marciano Vasques

A SAPA MAIS FEIA DO MUNDO

Passa por eles uma sapa e a Sapabela comenta:
- Veja, Rospo, que sapa linda! Não conhecia essa jovem. É realmente linda!
- É feia!
- Está louco, Rospo? Como pode dizer isso?
- É mais do que feia, é horrível, aliás, nunca vi tanta feiúra.
- Acho melhor explicar isso, meu amigo.
- Ora, Sapabela, a beleza exterior, a beleza do rosto de nada vale...
- Beleza é fundamental, Rospo...
- Deixe-me terminar.
- Desculpe. Pode continuar.
- A beleza da aparência não tem valor se o interior é feio. Vou dizer porque ela é feia.
- Diga.
- Ela é racista, preconceituosa, fofoqueira, e desvaloriza os amigos, quase sempre desmoraliza os colegas, além de ser invejosa.
- Tudo isso?
- Pois é.
- Tem razão, amigo, ela é feia, muito feia. Mas como sabe tanto sobre ela?
- Apenas observo, finjo que não ouço...
HISTÓRIAS DO ROSPO — 23
Marciano Vasques

AS JOIAS INVISÍVEIS

Rospo e Sapabela conversam quando passa por eles uma sapa repleta de joias caras. Brincos, anéis, colares, broches  e pulseiras.
- É tudo tão brilhante, tão colorido e tão valioso! Essa sapa está muito enfeitada.
- É bonito realmente,  e eu gosto de ver, Sapabela. Afinal são as joias visíveis, aquelas que têm preço no mercado.
- Joias visíveis? Por acaso existem joias invisíveis?
- São as que não podem ser penduradas no pescoço. Elas não têm preço.
- Então são muito valiosas.
- Um poema que você leu e guardou consigo, uma história que contou para um sapinho, um abraço, um beijo, um olhar amoroso, um sorriso...um aperto de mão sincero, uma conversa, uma canção de ninar, um gesto de amor...
- Rospo, não sabia que tinha tantas joias dentro de mim.
- Eu sempre soube.
- Consegue ver as joias invisíveis?
- Todos conseguem. É só limpar o olhar no riacho da poesia quando ele estiver embaçado pela rotina.
 
HISTÓRIAS DO ROSPO — 22
Marciano Vasques

O SAPO ALIENADO

No sábado, os verdadeiros amigos procuram se encontrar, e adivinhe para quem o Rospo está telefonando?
- Sapabela, tem sorvete hoje?
Logo os dois estão caminhando numa calçada.
- Rospo, tem sapo que aprecia o lado bom da vida, mas esquece os que sofrem, os oprimidos e os desamparados.
- São sapos alineados. O sapo que só pensa no lado bom da vida, mas não denuncia , não dá o seu apoio para que os desfavorecidos, os explorados possam modificar a vida, são sapos tristes.
- Sapos alineados são sapos tristes?
- Sim, minha cara sapa.
- Antes eu tinha vergonha e receio de apreciar o lado bom da vida. Pensava que fosse coisa apenas de burgueses.
- Que nada, Sapa! O lado bom da vida está na beleza da flor, na arte, no conforto. Você deve se orgulhar de apreciar tudo isso, e também, mesmo que apenas com palavras, contribuir com os que ainda não tiveram acesso a esses bens por motivo de opressão.

MARCIANO VASQUES
HISTÓRIAS DO ROSPO — 21